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O futuro a tomar conta do presente

Desde a nossa existência que, directa ou indirectamente, somos um veículo de transmissão de informação. Desde os tempos longíquos das pinturas rupestres, papiros, novos manuscritos, sinais de fumo, discursos, palestras, até chegar aos livros, são tudo manifestações de uma vontade de expressar uma mensagem. Seja em casa, nas escolas, nas empresas, qualquer interação acaba por resultar na passagem de conhecimento. Pelo que se diz, pelo que se faz, pelo que se observa. De pessoas para pessoas. Uma partilha enorme do saber daqueles que, por vocação, por curiosidade, por formação ou simplesmente pelo gosto, investigam matérias diversas que fazem o mundo avançar. Podemos chamar Human Learning.



Entretanto, com a descoberta da roda, veio o movimento, a dinâmica, e mais tarde deu-se a revolução industrial, no final do séc. XVIII que permitiu à humanidade avançar, originando grandes transformações sociais e económicas, desta vez, substituindo a força humana pelo esforço da máquina. Mas a potência, a robustez e a precisão não eram tudo. A ciência foi mais longe e desenvolveu a capacidade de raciocínio, e surgiram as primeiras máquinas de calcular. Depois a necessidade de comunicar, fazer-se ver e ouvir e com esta necessidade apareceu o telégrafo, o fax, o telefone, a rádio e a televisão.


Aos poucos o ser humano foi passando para a máquina informação valiosa para, de seguida, a máquina transformar e devolver em forma de (poupança) de tempo, através da mecanização de determinadas tarefas. Uma relação aparentemente justa, enquanto as invenções eram vistas como complemento da actividade do ser humano. São exemplo disso os motores a vapor, as semeadoras, a máquina de costura, a máquina de escrever, o cinematógrafo, o tear eléctrico, só para mencionar alguns.


Todas estas invenções procuravam libertar o ser humano de tarefas repetitivas, aumentar a capacidade produtiva de cada país, vencer na competitiva guerra do comércio internacional e com isso aumentar a riqueza das nações e a qualidade de vida dos cidadãos. A guerra não se fez apenas sentir nas trocas comerciais, mas também no confronto bélico, dando origem à I e II Guerras Mundiais, que levou à dinamização de um indústria de armamento, meios de transporte e tecnologia.


Uma das armas mais poderosas e determinantes na gestão de conflitos é a comunicação.

No auge da guerra fria, nos anos 60 do século passado, surgiu a necessidade por parte dos E.U.A. de responder à União Soviética que tinha acabado de lançar o satélite SputniK 1. Nesse sentido, foi constituída a ARPA (Advanced Research Projects Agency) com vista a desenvolver nova tecnologia militar, dando origem ao programa ARPANET, liderado por Larry Roberts, formado em engenharia electrónica com doutoramento pelo MIT. O seu grande objectivo era conseguir que diversos computadores, geograficamente distantes uns dos outros, comunicassem entre si, na mesma linguagem, para partilharem informação. Se antes esta tecnologia era apenas utilizada no domínio militar, em 1989 este fenómeno ficou acessível a todos, com a criação da World Wide Web, pelas mãos de Tim Berners-Lee, físico britânico e professor do MIT.



Chegados aos dias de hoje, em que o número de utilizadores da internet corresponde a cerca de 62% da população mundial, o ser humano, que nunca para, já sente necessidade de novos fenómenos. De facto, a transmissão de informação entre o ser humano e a máquina pode chegar mais longe, onde nem o céu parece ser o limite. Basta que haja quem tenha uma curiosidade e ambição ininterruptas para esticar ao máximo as capacidades da nossa inteligência e passá-las à máquina. E, "num instante" eis chegados à inteligência artificial (IA), onde passamos de human learning para machine learning, como nunca visto.



Hoje em dia, com a explosão da inteligência artificial (IA) e sua aplicação em inúmeras áreas da economia, da ciência, da gestão, da saúde, da arte, do entretenimento, entre outras, discute-se, novamente, a substituição do ser humano pela máquina. Agora de forma mais ameaçadora, já que a máquina está cada vez mais perto das capacidades do ser humano. Estamos a abrir mão de tudo o que sabemos, para em troca recebermos tudo feito. Bem-vindos ao renovado admirável mundo novo, que tem tanto de atractivo como de assustador.


Os resultados práticos da IA já permitem, nos dias de hoje, usufruir de computadores mestres em xadrez, carros autónomos, sistemas de GPS, mecanismos de atendimento ao público, padrões de compras online, sugestões de conteúdos em streaming, traduções, entre muitas outras. Está tudo de tal forma automatizado que por vezes nem nos apercebemos da velocidade com que certas soluções são aplicadas no dia-a-dia.


Há quem diga que são as emoções, as motivações e a consciência que estabelecem a diferença entre o ser humano e a máquina. Até quando?

No passado mês de Março, cerca de 2.600 signatários, entre eles Elon Musk, Steve Wozniak (co-fundador da Apple), o historiador Yuval Hariri assinaram uma carta aberta, publicada pela Future of Life Institue a pedir uma pausa temporária, por 6 meses, no desenvolvimento da IA, para estabelecer autoridades reguladoras, sistemas de vigilância e métodos que ajudem a distinguir o real do artificial. Esta carta defende, em traços gerais, que esta nova tecnologia representa "riscos profundos para a sociedade e para a humanidade".


São várias as questões que se levantam e dão que pensar:

- devemos deixar que a máquina encha os canais de informação com conteúdos duvidosos que podem, no limite, enganar a verdade?

- como se reduz a propagação viral que confunde a linha onde termina a verdade e começa a ficção?

- quais são os mecanismos de validação se o output das máquinas não vem acompanhado de referências bibliográficas?

- devemos desenvolver mentes não humanas que eventualmente possam ultrapassar-nos, tornar-nos obsoletos e substituídos?

- devemos arriscar perder o controlo da nossa civilização?

- devemos arriscar uma mudança profunda na história da vida na Terra?


A este propósito, recomendo que oiçam o podcast "Old Friends" da Antena 1, sobre IA, disponível aqui.


A verdade é que somos todos (ainda) cobaias deste modelo de aprendizagem automático, em constante mudança, que acelera por necessidades económicas mas que agora querem travar, por precaução, dada a forma como aceitamos a informação e os perigos na crença da infalibilidade da máquina.


O mais importante é saber interpretar o que está a acontecer, não haver excesso de confiança, não perdermos o sentido e pensamento críticos e estarmos atentos aos sinais que revelam a evolução desta "espécie".





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